
Continuando nosso protesto contra a iniciativa de produtores gaúchos de vinho de solicitar salvaguardas ao Governo Federal, o que acarretará aumento de preços e diminuição dos rótulos de vinhos estrangeiros disponíveis no Brasil (vide mais em http://www.vinocult.net/2012/03/ataque-ao-bolso-e-os-curadores-do-gosto.html), segue artigo do jornalista Carlos Sardenberg publicado na edição de "O Globo" de 22/03/2012:
“PÁTRIA
AMADA
Acusam
os estrangeiros, mas a culpa é nossa
Já
houve um tempo em que era praticamente proibido importar vinhos no Brasil. A
produção local era soberana. Depois, começaram a aparecer uns vinhos argentinos
muito ruins, de quinta categoria lá, mas tratados aqui como finos. A produção
local continuou sem competição.
Não se
notou qualquer melhora do vinho nacional nesse longo período de proteção. Ao
contrário, o produto fabricado aqui, com uvas locais, só começou a dar sinais
de melhora quando a importação se abriu e o brasileiro começou a conhecer o que
era um bom vinho. O consumo foi crescendo, por essa razão, o aumento da oferta,
mas também seguindo padrões globais de comportamento, nos quais o vinho ganhou
até um aspecto cultural. Assim, nos últimos anos, aumentou tudo, consumo,
importação e produção interna.
Mas
isso não está bom, na opinião de associações de produtores locais. Pediram e o
governo abriu uma investigação para avaliar a aplicação de salvaguardas – cotas
ou mais tarifas de importação sobre o vinho (a atual tarifa é de 27%, já muito
alta, mas não se aplica aos países do Mercosul, Argentina e Uruguai, e ao
Chile, que tem acordo especial).
O caso
ainda está em estudos no Ministério do Desenvolvimento, mas o discurso da
presidente Dilma aos produtores, feito no Rio Grande do Sul, deixou todos eles
muito animados.
Hoje, o
vinho nacional alcança níveis razoáveis de qualidade. Mas perde na relação
custo/benefício. Com o preço que se paga por um bom nacional compra-se um
argentino ou chileno bem superior. E esses estrangeiros já chegam aqui muito
mais caros do que em seus países de origem. O pessoal das vinícolas chilenas se
espanta quando sabe do preço cobrado pelos seus produtos no Brasil.
Mais ou
menos na mesma época em que não se podia importar bons vinhos, era proibido
importar carros, bons ou ruins. Esse mercado era totalmente fechado e
protegido.
Quando
se abriu, no início dos anos 90, verificamos que décadas sem competição haviam
deixado as famosas carroças. A indústria só começou a avançar quando submetida
à concorrência externa.
De 2000
para cá, a estabilização da economia, a consequente volta do crédito e a
expansão global puxaram o crescimento do país. O mercado chegou a 3,5 milhões
de carros, o quarto ou quinto do mundo.
Mas
também não está bom para os produtores locais, todos multinacionais. O setor
pediu e já conseguiu várias formas de proteção contra os carros importados.
O
governo, conforme têm dito a presidente e os ministros Guido Mantega e Fernando
Pimentel, não vai fazer o papel de bobo e deixar que os estrangeiros venham
aqui conquistar nosso mercado.
Há
situações em que a produção local pode e deve ser protegida. A legislação da
Organização Mundial do Comércio, à qual o Brasil está submetido, prevê esses
casos. Por exemplo: exportações predatórias, a preços artificialmente baixos,
podem ser barradas. Também admite dar um tempo de proteção até que uma
determinada indústria local nasça e/ou ganhe mais musculatura.
Mas, no
geral, o comércio internacional e a abertura dos mercados constituem fatores de
desenvolvimento global e nacional. Isso mesmo, importação é bom. Os países
ganham com as importações. Ganha a produção local, com a aquisição de tecnologias
e insumos modernos, e ganha o consumidor, que têm à sua disposição uma maior
variedade de produtos de qualidade.
Nenhum
país precisa produzir tudo que consome. E um país do tamanho do Brasil nunca
será essencialmente importador. É mais negócio produzir neste mercado tão
grande. Hoje, por exemplo, apenas 18% das compras externas são bens de consumo.
Assim,
o nacionalismo não passa de um falso discurso. Não chegaram a tanto, mas estão
quase nos dizendo que importar é um ato de lesa-pátria. E estão nos vendendo
gato por lebre. Dizem que as medidas protecionistas se enquadram no programa de
criar condições de inovação e ganhos de eficiência para a indústria nacional. É
falso.
O que
estão fazendo, simplesmente, é exportar o custo Brasil. Sim, está difícil a
vida da indústria no Brasil. Mas não é por causa do ataque dos estrangeiros.
Está difícil porque é caro produzir no Brasil. É caro fazer negócios no Brasil,
inclusive no comércio de importados.
O dólar
é parte do problema, mas hoje certamente está longe de ser a parte principal.
Reparem: a moeda chilena também está valorizada e o vinho deles, melhor, sai
mais barato que o brasileiro idem para a moeda mexicana, e o carro deles também
sai melhor e mais barato.
Proibir,
limitar e/ou taxar os importados não trará qualquer ganho de eficiência nem de
escala à produção local. Apenas tornará todos os produtos, nacionais e
importados, mais caros.
Resumo
da ópera: como é difícil ter um plano de médio prazo para a redução do custo
Brasil e a eliminação dos entraves à eficiência nacional e como é difícil
justificar tecnicamente as medidas protecionistas, parte-se para esse falso e
perigoso patriotismo, que é o ataque ao estrangeiro.
Como o
governo e produtores argentinos fazem com a gente”.
E se você, caro amigo, é contra essa
iniciativa dos produtores de vinhos gaúchos, compartilhe essa matéria e outras
similares, e subscreva o abaixo-assinado no seguinte endereço eletrônico (leva
um minutinho): http://www.winereport.com.br/outrascachacas/wr-e-contra-a-lei-da-salvaguarda-e-sugere-boicote-ao-vinho-nacional-se-projeto-passar-/1841
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