Saborear um cálice de vinho é tão complexo como saborear um caldinho de mocotó, muito embora o ato sensorial que capta as propriedades organolépticas de um e de outro tenha circunstâncias muito diversas. Com certeza, um experiente sommelier e um gourmet sem preconceitos são respectivamente capazes de revelar-nos – com poesia - a experiência sensorial que há numa delicada taça de vinho e aquela que se esconde num menos delgado copo de caldinho de mocotó.
Se o corte de duas castas tintas traz tamanha complexidade a uma taça de Bordeaux, imaginem a paleta de aromas e sabores que os 10 - plus minus - ingredientes do caldinho de mocotó podem criar. Obviedades à parte, pergunta-se: a quem interessa a complexidade de aromas e sabores do caldinho de mocotó? Ao grande público certamente não, pois não encontramos publicações como MocotóSpectator, MocotóMagazine ou MocotóEnthusiast.
Tampouco batizamos este blog de MocotóCult...
Tampouco batizamos este blog de MocotóCult...
No entanto, voltemos ao título deste post. Trata-se de mera referência à nossa memória sensorial ou, muitas vezes, à nossa “prisão sensorial”. Atualmente, o tempero da avó quase não tem espaço na rotina das grandes metrópoles como Rio e São Paulo ou em cidades européias populosas como Munique, Berlim, Viena, Paris... mas em toda família há uma rotina gastronômica – mesmo que esta passe pelo drive thru do McDonald’s. É esta rotina gastronômica que nos coloca em contato com os aromas e sabores que somos capazes de reconhecer. Quanto mais diversificada a gastronomia da família, mais rica é a nossa biblioteca sensorial.
Daí sempre causar-me espanto a apurada percepção sensorial de city slickers - dentre os muitos neófitos no mundo da degustação - capazes de distinguir as diferentes frutas do bosque potencialmente presentes numa taça de Douro. Para mim, carioca criado à base de frutas cítricas, distinguir um blueberry de um blackberry – que não recebe e-mails – só mesmo com muito esforço. Sem contar que, até os 18 anos, o bosque mais perto que conhecia ficava em Petrópolis, a 80 km do Rio.
Assim, posso dizer que as frutas cítricas são uma de minhas prisões sensoriais. E para abrir este cadeado só mesmo usando o segredo dos frascos mágicos do Le Nez du Vin...
Na zdravie!
Na zdravie!
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